“Não existe, em nenhum lugar do mundo, eleições não polarizadas”
De olho nas eleições de outubro, o professor da Faculdade de Ciências Sociais da UFG, Ricardo Barbosa de Lima, analisa que o eleitorado tende a avaliar questões econômicas para a escolha dos candidatos nas eleições deste ano. Para ele, a crise econômica e o consequente empobrecimento da população brasileira impactará na tomada de decisões dos brasileiros.
Em entrevista ao Goiás Notícia, o Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UNB) analisou os cenários políticos nacional e estadual e prevê quais critérios serão adotados pelo eleitor para definição do voto.
Sara Cristina – Eleição terá disputa de ideologias?
Sim. Toda eleição é uma disputa de ideologias. Em tese, é isso que os diferentes partidos oferecem. É o princípio de uma eleição liberal e democrática. Cada partido, a partir de suas convicções, oferece ao eleitor diferentes maneiras de governar, com diferentes ideologias e perspectivas. O regime democrático tem uma particularidade diferente dos outros regimes tendo em vista que não há definição de quem irá governar. Qualquer pessoa pode governar, desde que eleita pelo povo. O desafio da democracia é renovar o pacto social de que qualquer um de nós pode governar a todos.
Sara Cristina – A polarização nacional é inevitável?
Não existe em nenhum lugar do mundo eleições não polarizadas. É raríssimo o momento em que temos mais de dois competidores, partidos e ideologias competitivas. A exemplo dos Estados Unidos, há pleitos que apresentam inúmeros postulantes à presidência, tendo em vista que lá existem candidaturas avulsas, mas apesar disso, a eleição costuma ser polarizada entre democratas e republicanos. A não polarização por vezes aparece com três forças disputando com iguais chances de ganhar, mas duas forças distintas disputando corações e mentes é a coisa mais vista em eleições. É raro que isso não aconteça nas democracias liberais como o Brasil.
Sara Cristina – Como o senhor avalia essa polarização no estado de Goiás?
O que temos hoje em Goiás é uma disputa da base conservadora. As candidaturas que estão postas hoje disputarão o mesmo eleitorado e possuem o mesmo viés ideológico. Elas disputam a base bolsonarista. Temos a busca pela reeleição de Ronaldo Caiado e a postulação do ex-prefeito de Aparecida de Goiânia, Gustavo Mendanha. Ambos declararam disputar o mesmo eleitorado. Temos também o Major Victor Hugo como uma terceira força que disputa o mesmo espectro. Em meio a tudo isso, temos Marconi Perillo, ex-governador que possui uma longa trajetória marcada por altos e baixos no governo do estado. A expectativa é saber se a força dele volta para o jogo ou não.
Sara Cristina – O que é o que nós costumamos chamar de terceira via? Em Goiás, quais são seus principais atores atualmente?
De forma geral, terceira via seria um caminho alternativo a polarização clássica. Acontece quando identificamos que uma determinada polarização se esgarçou e não rende frutos no sentido de conquistas democráticas. O que eu acho que acontece no Brasil é uma interpretação muito rasa disso. Os nomes da terceira via se colocam como uma terceira força centrípeta, que tensiona para um outro lado. Então os candidatos se colocaram, não como uma alternativa a Lula e Bolsonaro, mas como opositores aos dois ao mesmo tempo. Não há uma apresentação ideológica diferente, com propostas e perspectivas diferentes. Resume-se ao “anti”. Bolsonaro fala mal de Lula, Lula fala mal de Bolsonaro e a terceira via fala mal dos dois. Resume-se a ser anti-Bolsonaro e anti-petismo. Em Goiás, temos Caiado, Mendanha e Victor Hugo disputando a mesma base eleitoral. O Partido dos trabalhadores, que até o momento tem como pré-candidato o ex-reitor da PUC, Wolmir Amado, entra como uma terceira via. A incógnita é o tamanho da força que está fora do páreo. Marconi Perillo pode se tornar um quinto player. Ele vai se candidatar ao governo? Se for, o que ele vai retirar dos três candidatos que disputam a mesma base? Apesar da enorme rejeição registrada nas pesquisas qualitativas, caso ele entre na disputa pode causar um embaraço no cenário.
Sara Cristina – Qual o adversário mais difícil para Caiado: Gustavo ou Marconi?
Se Marconi entrar na disputa, ele não entrará de maneira protocolar. Ele entrará de maneira muito forte. Costumo avaliar a geografia do voto e existem três lugares muito importantes para analisarmos. Região metropolitana, interior do estado e o entorno do Distrito Federal. Hoje, cada um desses lugares tem um dono específico. Caiado reina no interior. Gustavo afronta Caiado na região metropolitana e, dependendo da configuração, o ultrapassa. Mas nenhum deles possui a presença que Marconi Perillo tem no entorno do Distrito federal. Em cada uma dessas trincheiras, esses jogadores têm possibilidades muito grande de se afirmar. Se Marconi entrar no jogo, ele vai para cima da base de Caiado? Vai para cima do eleitorado da região metropolitana? Ou ele vai se consolidar forçando um segundo turno? É um xadrez que está posto.
Sara Cristina – Quais pautas são consideradas mais emergentes pelo eleitorado para a eleição deste ano?
Sem dúvidas, pautas econômicas. Nos cenários nacional e estadual, a corrupção aparece isoladamente, mas as pautas econômicas e sociais são as mais emergentes do ponto de vista do eleitorado. Há um empobrecimento da população que afetou vários aspectos da sociedade, como por exemplo o acesso a alimentação, ao lazer e ao entretenimento. Atingiu a infraestrutura de moradia e habitação. O que será avaliado pelo eleitor é a entrega. Eu diria que a análise do eleitor é: minha família, minha casa, minha rua, meu bairro e minha cidade. Está difícil para o cidadão olhar para além disso. As pessoas, independente da ideologia, procurarão governos que entregam.